segunda-feira, 19 de março de 2018

Foto de Carlos Saramago - Artista plástico.
Desenho de Carlos Saramago
Diz que já viveu outras vidas,
todas suas.
Diz que já morreu outras mortes,
não se lembra.
Nem das vidas, nem das mortes,
apenas as pressentiu num arrepio,
num sonho ou talvez apenas no esvoaçar de algum pássaro da noite.
Olhando-se num espelho
reviu-se noutros corpos,
todos seus,
que eram seus aqueles olhos.
Falaram-lhe os reflexos de si,
disseram-lhe que se fosse para trás do espelho
que era ali que tinha de se reencontrar,
era ali, e só ali, que se iria reconhecer.
E foi, mas não foi a si que encontrou.
Ali só encontrou o vazio deixado por todas as mortes que já morrera,
ali não havia mais nada senão as memórias de outras vidas
e essas já não falavam,
já não olhavam.
Estavam mortas.
Todas.

Irremediavelmente mortas.

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